quarta-feira, outubro 15, 2008

O FADO LUSITANO ( e não só)






No sobe e desce da bolsa, no coração dos aflitos, no crédito mal parado, na falta de escrúpulos, na miséria, na pobreza, descendentes de gerações perdidas, pilares osteoporóticos de sustentação da sociedade, anjos da guarda do exótico totobola das almas em que se promovem Paraísos, parafernália de consensos intoxicados de viroses mais ou menos sedimentadas e com hipóteses de Nobel. Procuremos no lado escuro da lua o preceito mais que prefeito da arte de fugir entre os pingos da chuva.
De tanto fingir que não viam, ficaram de facto cegos. Agora é tarde. Paz às vossas acções. Ave mercado, as que vão morrer saúdam-te.
Vejo-os aturdidos, sufocados na própria ganância. Já Peter Pan vendia acções da Terra do Nunca. É por isso que devemos ter em atenção as histórias da nossa infância.
É que ser grande não significa ser grande coisa.

Uma lição do grande O'Neill

“Saber Viver é Vender a Alma ao Diabo” – Alexandre O’Neill

Gosto dos que não sabem viver,
dos que se esquecem de comer a sopa
(«Allez-vous bientôt manger votre soupe,
s... b... de marchand de nuages?»
e embarcam na primeira nuvem
para um reino sem pressa e sem dever.

Gosto dos que sonham enquanto o leite sobe,
transborda e escorre, já rio no chão,
e gosto de quem lhes segue o sonho
e lhes margina o rio com árvores de papel.

Gosto de Ofélia ao sabor da corrente.

Contigo é que me entendo,
piquena que te matas por amor
a cada novo e infeliz amor
e um dia morres mesmo
em «grande parva, que ele há tanto homem!»

(Dá Veloso-o-Frecheiro um grande grito?...)

Gosto do Napoleão-dos-Manicómios,
da Julieta-das-Trapeiras,
do Tenório-dos-Bairros
que passa fomeca mas não perde a proa e parlapié...

Passarinheiros, também gosto de vocês!
Será isso viver, vender canários
que mais parecem sabonetes de limão,
vender fuliginosos passarocos implumes?

Não é viver.
È arte, lazeira, briol, poesia pura!

Não faço (quem é parvo) a apologia do mendigo;
não me bandeio (que eu já vi esse filme...)
com gerações perdidas.
Mas senta aqui, mendigo:
vamos fazer esparguete dos teus atacadores
e comê-lo como as pessoas educadas,
que não levantam o esparguete acima da cabeça
nem o chupam como você, seu irrecuperável!

E tu, derradeira geração perdida,
confia-me os teus sonhos de pureza
e cai de borco, que eu chamo-te ao meio-dia...

Por que não põem cifrões em vez de cruzes
nos túmulos desses rapazes desembarcados p’ra morrer?

Gosto deles assim, tão sem futuro,
enquanto se anunciam boas perspectivas
para o franco frrrrançais
e os politichiens si habiles, si rusés,
evitam mesmo a tempo a cornada fatal!

Les portugueux...
não pensam noutra coisa
senão no arame, nos carcanhóis, na estilha,
nos pintores, nas aflitas,
no tojé, na grana, no tempero,
nos marcolinos, nas fanfas, no balúrdio e
... sont toujours gueux,
mas gosto deles só porque não querem
apanhar as nozes...

Dize tu: - Já começou, porém, a racionalização do trabalho.
Direi eu: - Todavia o manguito será por muito tempo
O mais económico dos gestos!

Saber viver é vender a alma ao diabo,
a um diabo humanal, sem qualquer transcendência,
a um diabo que não espreita a alma, mas o furo,
a um satanazim que se dá por contente
de te levar a ti, de escarnecer de mim...

1 comentário:

Anónimo disse...

brilhante..parabens pelo vosso blogue.


zé cenoura